sábado, 11 de outubro de 2008

Jornalismo rural?

Revisando meus arquivos descobri por acaso uma reportagem do ex-colega de faculdade Janderson Correia. Infelizmente ele optou por abandonar o jornalismo e partiu para Comunicações Visuais. Na final de 2007, ele tratava de uma forma crítica, a qualidade de cursos de jornalismo em áreas semi-rurais. Queria mostrar a sociedade a viabilidade do curso e desmistificar que jornalismo só se faz em ambientes “urbanos” das grandes cidades. O curso de jornalismo de Alto Araguaia ainda está em desenvolvimento, mas já produz frutos. Estamos com seis turmas. No III simpósio de jornalismo (regionalização Midiática). Produzimos dois jornais laboratórios: o ProvocAção e o jornal mural O paredão.

Pato seqüestrado, furto de bicicleta, curso para fazer pastel,... Notícias pitorescas ou banais parecem ser as únicas informações possíveis em cidades pequenas quando o assunto é jornalismo. Muitas pessoas costumam relacionar a profissão de jornalista com os grandes centros urbanos. Lá, onde o mundo faz e acontece. Com tantos acontecimentos são considerados verdadeiras fontes da matéria prima do trabalho jornalístico: a informação. Essa idéia torna difícil imaginar um curso de jornalismo feito no interior, em áreas semi-rurais. Onde o tempo parece ter vontade própria e resiste ao ritmo do mundo globalizado.

Em Alto Araguaia, cidade com 13.000 habitantes localizada no interior de Mato Grosso, a chegada do curso de jornalismo pela Unemat provocou certa polêmica no inicio de 2006. As pessoas questionavam as condições do município para receber um curso de “cidade grande”. Em que situação seria formado um jornalista, a perspectiva para o mercado de trabalho local e o tempo de sobrevivência do curso foram as principais dúvidas levantadas. O site Observatório da Imprensa também falou sobre o novo curso na época e os desafios de um dos poucos cursos de jornalismo em áreas semi-rurais do Brasil.

Uma das justificativas para a cidade receber o novo curso é devido à sua localização estratégica: na confluência dos estados de Mato Grosso, Goiás e Mato Grosso do Sul, facilitando o acesso às vagas para cidades dos três estados.

Alto Araguaia parece ter uma enorme vontade de produzir informação. A cidade possui duas rádios (AM e FM), uma televisão com uma hora e meia de programação local e um site sobre acontecimentos locais. Tem ainda a sala de imprensa da Câmara Municipal de Vereadores, com sistema de radio e TV para transmissão integral das sessões à população. Pode-se somar a isso o apoio da prefeitura para a implantação do curso de jornalismo na cidade, que cobriu os gastos dos primeiros seis meses.

O curso de jornalismo de Alto Araguaia é o primeiro da Unemat e o segundo oferecido gratuitamente no estado. Atualmente está indo para o quinto semestre com 148 alunos em situação regular. O corpo docente é formado por cinco professores mestres, um doutor e um doutorando, vindos dos estados de São Paulo, Paraná, Espírito Santo e do próprio Mato Grosso. O processo de reconhecimento do curso está em andamento e já concluiu etapas importantes. Como a realização do 1º Colóquio de Jornalismo – A formação sob o olhar sincrônico realizado em julho deste ano para discutir a identidade do curso e o mercado de trabalho na região.

O projeto pedagógico do curso foi elaborado não só para uma formação global, mas para formar jornalistas que produzam conteúdo com a voz local. Temas regionais na grade curricular e disciplinas práticas de jornalismo especializado, como turismo, meio ambiente e jornalismo rural, demonstram essa preocupação. Para Wedencley Alves, um dos responsáveis pelo projeto, a proposta foi "montar um curso que viria a formar alunos que não desempenhassem o papel de pura correia de transmissão dos modelos do Centro-Sul urbano, fonte de estereótipos tolos".

A globalização não permite mais considerar a redação o único local de trabalho do jornalista. As novas tecnologias possibilitam novas áreas de atuação para o comunicador social. Além disso, um curso de jornalismo se torna viável em cidades como Alto Araguaia por causa da diminuição dos preços dos equipamentos digitais. O custo para a montagem de um estúdio de TV, por exemplo, está mais acessível. Assim como o preço de uma câmera filmadora ou fotográfica está mais em conta a um jornalista free lancer.

Com a internet surgiu a produção on line, que descentralizou a produção de conteúdos deixando no passado os centros produtores. A distância não é mais um obstáculo para o jornalista. Agora uma informação é facilmente produzida de qualquer parte do mundo para qualquer lugar.

A presença do curso de jornalismo em Alto Araguaia ajudará a criar desde cedo na população uma consciência crítica sobre a sua realidade social e política. Alto Araguaia desenvolverá não apenas o seu espaço físico, mas também o seu plano intelectual. Se tornando uma cidade “grande” não pelo numero de habitantes ou pela quantidade de acontecimentos, mas pela qualidade com que produz informação.

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